Triste realidade de 35 famílias que foram transferidas em tempo de chuva e frio pela Prefeitura para uma área improvisada e sem qualquer infraestrutura urbana
A cidade de Chapada dos Guimarães, com seus paredões rubros e cachoeiras recônditas é um dos principais destinos turísticos do estado de Mato Grosso. Porém, no momento, passa por uma situação inusitada com sofrimento experimentado por diversas famílias de moradores que estão sendo desalojadas de uma área urbana (considerada de preservação ambiental) que estava ocupada pelas mesmas há longo tempo. A prefeitura decidiu pela retirada dos moradores, no mais curto espaço de tempo e, tenta ocultar a forma precipitada como está procedendo no processo de desocupação da área.
Na tarde desta quarta feira, 23 de janeiro, os moradores da localidade ocupada e, considerada pela administração municipal como Área Verde, no Loteamento Vale da Chapada, foram notificados de que, na manhã do dia seguinte, deveriam desmontar seus barracões para serem levados por um caminhão até uma outra área determinada pela prefeitura. Os novos lotes nesta área foram sorteados entre as famílias numa reunião marcada às pressas pela assessoria da prefeita Thelma de Oliveira (PSDB).
Tudo foi feito às pressas pois, até então, os moradores só haviam sido notificados do nome do lugar para onde seriam levados: Loteamento “Pôr do Sol” – localizado nas proximidades da rodovia para Cuiabá - ponto oposto de onde está localizada a ocupação anterior e considerada Área Verde. A promessa da destinação dos lotes às famílias desalojadas desperta, nas mesmas a esperança da terra própria, dotada de infraestrutura elétrica e hidráulica adequadas.
A Prefeitura determinou como data limite para a saída pacífica e, desocupação total da área, o dia 17 de fevereiro. Porém, com o intuito de acelerar a retirada dos moradores impôs, inesperada e precipitadamente, uma ação de despejo iniciada na manhã do dia 24 de janeiro. Alegando o pretexto de garantir auxílio para o desmantelamento e transporte dos barracões – através do fornecimento de mão-de-obra e caminhões – a Prefeitura impôs a desocupação da área até o dia 26 de janeiro (sábado). E, após esta data, os moradores terão que abandonar a ocupação por conta própria pois, já no dia 17 de fevereiro, as máquinas virão para desalojar os remanescentes.
Na manhã de quinta-feira (24/01), foi iniciada a retirada dos moradores e seus pertences, acompanhada por alguns poucos funcionários da prefeitura! No momento em que os moradores eram encaminhados para ocupar os lotes no “Pôr do Sol”, veículos da Prefeitura e da Polícia Militar patrulhavam as duas regiões.
Ocupação na Área Verde do Loteamento Vale da Chapada
A moradora mais antigas da Área Verde - vivendo no local há quase 8 anos - Dona Cida (68) preocupa-se principalmente com o destino das plantas que cultiva durante todo esse tempo em seu quintal. Com um semblante assustado e olhos lacrimejantes nos mostra um limoeiro de pouco mais de um metro, que ela mesma plantou a semente, além de pequizeiros, dentre outras frutíferas e medicinais. Diz que não seria capaz de abandonar seus gatos, resgatados da rua. Enquanto isso chama a atenção para uma foto da flor do cacto mandacaru, ela pede que se realmente for construída uma praça no local, sejam mantidas as plantas cultivadas com zelo.
Vivendo há cinco anos na área, Jorge (35) nos acompanha por seu quintal/pomar, mostrando os pés de fruta, legumes e plantas medicinais que cultiva e viu crescer ao longo dos anos. O mesmo nos questiona sobre o destino da plantação no quintal: de que é retirado seu principal sustento. Preocupado, acrescenta: “Você arranca todas as plantas da face da terra e deixa só as casas para ver o que acontece: O calorão que vai ser”!
Uma das moradoras, que não se quis se identificar, conta que há dois anos um grupo foi despejado de uma ocupação próxima a esta e, naquele momento, os tratores chegaram às seis da manhã, sem nenhum tipo de aviso prévio. Estes viriam a ser os mais recentes ocupantes da Área Verde.
Entre moradores mais antigos e os mais recentes, observam-se diferentes resistências à mudança para o novo loteamento. Os ocupantes mais recentes anseiam pela regularização da sua situação, com a atribuição de um lote. Já com relações afetivas mais profundas com o pedaço de terra que habitam, os mais antigos gostariam de permanecer na morada que construíram e viram crescer.
A justificativa da prefeitura para o despejo e realocação é que a ocupação se encontra na área verde do Loteamento Vale da Chapada, um espaço destinado à construção de uma praça e centro comunitário, para além de não reunir as infraestruturas básicas necessárias para o estabelecimento das famílias assentadas.
Questionada sobre o destino dos moradores, de seus jardins e plantações, a prefeita Thelma de Oliveira afirmou estar cumprindo a “determinação do Ministério Público” e não uma decisão da sua administração. Segundo ela, no “Pôr-do-Sol” será garantida a posse legal dos lotes dotados de saneamento básico, água e luz; com escritura em nome do proprietário. No entorno da denominada “Área Verde”, estão construídos um motel, um condomínio de luxo e um posto de gasolina, tendo na mesma região - algumas ruas abaixo - um loteamento já estruturado. Em nenhum momento os moradores foram consultados ou fizeram parte das decisões relativas ao reassentamento, como determinam diretrizes de entidades como a ONU e a própria Constituição Federal, no que tange o direito à moradia.
Loteamento “Pôr do Sol”
O local de reassentamento dos moradores corresponde a uma área da prefeitura de Chapada dos Guimarães que foi grilada há anos. Alguns moradores atuais conseguiram seu direito de posse com a construção de moradias efetivas. Todavia, muitos dos terrenos se encontram em situação irregular, tendo sido vendidos pelos grileiros a novos proprietários que, na prática, não detêm direito sobre estas terras, a não ser que, efetivamente, as ocupem.
A chegada das famílias desalojadas foi uma surpresa para os moradores da região, tendo alguns realizado chamadas telefônicas para avisar os proprietários atuais de que seus terrenos foram destinados à realocação. Iniciaram-se assim, alguns questionamentos sobre as garantias dadas pela prefeita em relação ao direito de posse dos lotes.
As pessoas que acompanham os acontecimentos, muitas delas dirigentes comunitários, jornalistas e diretores de organizações não governamentais, não conseguem entender essa brusca e precipitada decisão tomada pelas autoridades municipais, sem que houvesse sido realizada uma avaliação antecipada do problema. Há mesmo, os que indagam porque a Prefeitura não realizou um Plano de Habitação, considerando a grave situação social de milhares de pessoas que sobrevivem em estado social de carência absoluta do conforto familiar ideal. Alguns, citam a política habitacional de governos anteriores que realizaram diversos projetos de habitação popular com construção de casas dignas para abrigo de famílias carentes. Milhares de bairros em diversas cidades no Estado quando apresentavam esse tipo de problema eram beneficiados pela administração pública com construção de moradias em alvenaria, constituindo os chamados conjuntos de habitação popular. Infelizmente não foi esta a mesma providência da administração municipal na cidade de Chapada dos Guimarães.
Distribuídas pelos lotes vazios sorteados, as famílias enfrentam, agora, a falta de condições mínimas para a sua habitabilidade. Receberam os terrenos sujos e carecem de estrutura habitacional que as albergue nos próximos dias. Muitas aguardam ao relento pelos caminhões que trarão seus parcos pertences, enquanto asseguram o seu lote. Dona Alda e seu filho, portador de necessidades especiais, se abrigam em uma varanda ao lado de seu lote, quando começa a chover no meio da tarde e se questionam como será essa primeira noite sem abrigo. Outros relatam temer os confrontos com os supostos proprietários dos lotes que lhes foram atribuídos pela prefeitura. O sentimento geral é de que foram “jogados como lixo”, sem garantias de respeito e dignidade.
O descaso da prefeitura de Chapada dos Guimarães com essas pessoas -muitas delas crianças e idosos- e suas existências gera revolta. As ocupações são uma resposta diante da maneira como são assistidas pelo poder público. É indigna a forma como foram notificados sobre data e hora do despejo, no meio da tarde anterior, numa reunião marcada às pressas. Algumas pessoas relatam ter passado a noite a juntar suas coisas e desmanchar seus barracos. Também chama a atenção a forma como a prefeitura se relaciona com as populações mais vulneráveis e o fato de que morador algum foi, anteriormente, ver os lotes para onde seriam realocados. Se revoltam aqueles que observam os funcionários da prefeitura caminhando pelas ruas de terra com suas justificativas vazias e falsas promessas à população. Mentiras que caem por terra algumas horas depois, quando, levados ao novo loteamento, encontram o lote que lhes seria destinado já ocupado. A covardia daqueles que deveriam estar protegendo e garantindo os direitos dessas pessoas, se evidencia.
Interessante ressaltar que a ocupação se encontra em um dos acessos ao município, à vista de todos os automóveis que transitam entre os diversos pontos turísticos localizados nesta parte da Chapada. É também de conhecimento geral o avanço da especulação imobiliária na região.
Reportagem e Fotos: Luz Marina/com a colaboração de Mafalda e Tulisa
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Choro e desespero em Chapada dos Guimarães